quarta-feira, 18 de novembro de 2015

A Apologia de Sócrates (VI) - Ideias finais (I)

A Grécia organizada em cidades-estados desde o século VI a.C. construiu uma civilização que criaria uma comunidade com suporte numa língua, numa ideia política de organização e em conjunto de valores religiosos e culturais. O progresso do conhecimento deu-se em diferentes áreas,tendo sido os percursores do nascimento de uma disciplina nova - a Filosofia. Palavra que tem origem nos termos gregos philein, que significa "amar" e sophia, que indica sabedoria. 

Nesta disciplina os gregos procuraram pensar os aspetos essenciais da existência humana, dedicando-se ao estudo do seu conhecimento e focando-se em aspectos como a ética (disciplina que se dedica a verificar a finalidade da vida humana e a discutir os meios para a alcançar), ou os valores morais e estéticos. É neste contexto que no século VI a.C. surgem pensadores que procuram de um modo racional encontrar explicações para a existência do Universo, da natureza e da vida humana. Abandonam uma visão mitológica da compreensão da existência e introduzem formulações, práticas de natureza argumentativa lógica (a arte de raciocinar) e racional. 

Tendo os pré-socráticos feito a passagem do mito (descrição simbólica) ao logos (entendimento racional),foram os sofistas os responsáveis por ideia de divulgação da retórica (a arte de argumentar e discutir ideias) e os iniciadores de uma ideia antropológica de discussão da vida e da existência. As suas ideias de formação ideal do cidadão permitiu-lhes dar um contributo importante para a ideia da participação do cidadão na vida pública da pólis. 

Sócrates (c.486-399 a.C.) aprimorou essa ideia antropológica e procurou estudar a natureza do homem e verificar como ela poderia ser aprimorada. Sócrates trouxe-nos a ideia da reflexão, como abordagem essencial para que o homem obtivesse um conhecimento de si próprio e assim atingir a verdade, o bem e o belo - itens do seu processo - a coragem socrática. Sócrates utilizava como método o questionamento para desocultar as sombras e o que cada interlocutor não consegui aceder apenas por si.  Em Sócrates vemos uma filosofia como instrumento para o conhecimento e entendimento do que somos. 

Sócrates deixou-nos um exemplo ético de exame às condições em que vivemos, ideia essencial presente nessa epígrafe "uma vida sem reflexão não merece ser vivida". Discutindo os conceitos básicos que organizam a vida quotidiana e que raramente são pensados, Sócrates incentivou o conhecimento de nós próprios, indicando que o exame de nós próprios e o nosso bem-estar daí decorrentes superam os códigos morais da sociedade, e nesse sentido é uma figura de uma clara universalidade. 

A virtude como um conceito absoluto discutido em Atenas ou em qualquer ponto do mundo revela-nos que traçou uma linha que garantia um plenitude (areté) capaz de eliminar todos os riscos do mal e dos seus agentes. Este evitava-se pelo crescimento do conhecimento e pelo combate à ignorância capaz de destruir toda a nobreza de espírito. O conhecimento surge assim como um padrão da existência e salvaguarda sobre as nossas capacidades humanas. Ao induzir os cidadãos num debate sobre a natureza do amor, a justiça, ou a lealdade, ao incentivar a conversação das pessoas com elas próprias tornou-se uma figura pública  ameaçadora.

Sócrates fundou não só a filosofia ocidental, como teve um papel essencial na formulação metodológica das ciências empíricas, pois propôs um método indutivo, que partia de um conjunto de ideias, baseadas na experiência para se chegar à formulação de uma conclusão, que possa ter uma dimensão de verdade universal. Aristóteles seguiu esta linha como pensador e filósofo. E Francis Bacon utilizou esta linha metodológica, aquando da construção do método científico. Sócrates é assim um nome essencial da memória coletiva da Humanidade.

Luís Campos (Biblioteca)

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