terça-feira, 11 de abril de 2017

Conteúdos na rede - A representação do belo - [O século XVIII] (6)

O século XVIII fez avançar a razão. Mas ela, como Kant o pressentiu tinha no su inetrior elementos não racionais, aquilo que ele designou “A beleza vaga”, aquilo que se integra no abstrato, e que se distingue da “Beleza aderente”. Aquilo que o século XVIII nos faz interrogar é essa dicotomia entre o intelecto que assume uma forma de “sentir”, como num quadro de Watteau e um outro “sentir” adjacente à razão e permeável à gentileza. Este belo, dividido entre o intelecto e a razão introduzem-se no campo da imaginação, naquilo que a moral consegue definir. A superação desta divisão será feita por Kant com o seu conceito de sublime e será explorada pelo Romantismo com a sua exploração do conceito da “Beleza vaga”.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: Jean-Antoine Watteau, A canção do amor, 1710-1720, Tate Gallery, Londres.
#Arazãoeabeleza
#Obelocomorepresentação

Kant reconheceu na natureza um poder ilimitado e uma ideia de infinitude. Kant reconhecia-lhe uma confiança que transmitia um valor de positividade, valor que não era demonstrável, mas que conduziria ou influenciaria o homem para uma ideia de progresso humano. Mas a natureza era também uma fonte de limitação à vida e por isso essa harmonia não era susceptível de se tornar uma emoção universal. Na verdade o Sublime, estádio superior do Belo é o reconhecimento de uma dimensão muito importante da razão humana, a sua independência em relação à Natureza, pela descoberta de uma faculdade ligada à experiência do sensível.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: Angelica Kauffmann, Auto.-retrato com o busto de Minerva, c. 1770, Uffizi, Florença.
#Arazãoeabeleza
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A Beleza também pode ser cruel e tenebrosa. É ainda Kant que o definiu. Nós temos uma razão que é independente da natureza e temos uma necessidade de encontrar uma fé nessa Natureza. A nossa razão pode desmaterializar um objecto compreendido e transformá-lo num conceito, ou ainda  pode tornar-se independente desse conceito. Dentro deste quadro, não poderão as coisas,as pessoas, a sociedade transformar-se num corpo manipulável? Assim, como se pode impedir as formas e os conceitos de planear o mal e a própria destruição da vida? Assim a Beleza pode ser uma máscara, atrás da qual se encontram os lados tenebrosos.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: Grancisco Goya y Lucientes, O sono da razão gera monstros, 1797-1798, Kusthalle, Hamburgo.
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Conteúdos na rede - A representação do belo - [O século XVIII] (5)

Nem sempre o século XVIII e em todos os lugares houve essa abertura e essa consagração do belo entre o homem sensível e a representação da natureza. Em Inglaterra William Hogarth não seduziu a sua construção de um belo narrativo, ou de uma representação pouco interessada no aspetos de classicidade da aristocracia britânica. A arte por vezes cria frustrações nas expetativas de um público que a consome e que não se revê em determinados valores. Don Juan de Mozart que prenuncia o início de um outro mundo mental é ainda quando representado olhado com alguma distância. A burguesia nem sempre gostou de se ver no espelho, ainda que seja de um génio.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: William Hogarth, Os criados da casa Hogarth, 1750-1755, Tate Gallery, Londres.
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O romance também deu conta do sentimento que  o século XVIII exprimiu. O diário íntimo
dará forma a esse sentimento, e lançará as sementes para o Romantismo. O romance do século XVIII avançará a ideia essencial para o futuro de que o sentimento não é uma perturbação criada pela mente, mas que é uma expressão da razão e da sensibilidade, o que revela ser um enriquecimento para a vida humana. O sentimento ao ser conquistado pela razão torna-se um elemento mediador de uma tirania que a razão poderia ter. Rousseau via no sentimento um antídoto para contrariar a beleza decadente e artificial e viu nele uma reconquista para o coração atingir uma beleza mais perfeita, mais íntima ou próxima da natureza.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: Jacques-Louis David, Retrato de Madame Récamier, 1800. Museu do Louvre, Paris.
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Não é possível falar do século XVIII e da sua estética sem referir Immanuel Kant e a sua obra A Crítica da faculdade de Juízo, datada de 1790. Kant será o apogeu dos aspetos subjectivos ligado ao gosto que o século XVIII afirmou. A experiência estética do Belo, para Kant, revela uma natureza desinteressada. O Belo é algo que nos agrada de um modo desinteressado, sem que isso seja originado por um conceito. Assim, o gosto é uma faculdade humana que consegue julgar de um modo desinteressado um objeto, ou a sua representação, como é o caso da Arte. O prazer que uma representação nos dá através de um olhar é que é o belo. Assim a universalidade do belo torna-se um conceito subjetivo. Pode ser uma ideia inicial de um criador, mas não necessariamente terá de ser apreendido por um valor universal de natureza cognoscitiva.
Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: George Romney, Retrato de Lady Hamilton como Circe, c. 1782, Tate Gallery, Londres. 
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Conteúdos na rede - A representação do belo - [O século XVIII] (4)


Diderot e Winckelmann viram nas ruínas uma duplicidade de sentidos. A beleza das ruínas, no sentido de nelas compreender a efemeridade da ação humana e a ruína do tempo e igualmente uma fé que permita uma reconstrução, uma fidelidade a algo original. As descobertas feitas pela Arqueologia levaram Wincklemann a querer reconstruir uma pureza do passado, quase como a que Rousseau imaginou possível para o homem, simples, em oposição a construções elaboradas, fictícias quer no plano humano, quer na arquitectura.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: Johann Heinrich Füssli, O desespero do artista perante a grandeza dos fragmentos antigos, 1778-1780, Kunsthaus, Zurique.

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O século XVIII criou uma definição estética de grande inovação em relação ao Renascimnto e ao que foi o século XVII. O século XVIII criou uma relação que o aproxima do mundo contemporâneo, um diálogo relacional entre público e privado. É o século da afirmação do papel das mulheres em salões literários e da introdução de novos temas artísticos.  O século XVIII rompe com a tradição de dependência total do artista em relação ao seu mecenas. O início de uma “indústria” editorial dará aos artistas e pensadores alguma independência. Mozart teria tido mais chances económicas se tivesse vivido no século XVIII, quando um músico já era um pouco mais interessante que um cozinheiro. As histórias nacionais ganham importância como narrativa escrita e lida. Neste século surgem também os compiladores de livros mais populares e que fazem a divulgação dos temas mais pertinentes dos grandes temas políticos e filosóficos.
Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.

Imagem: François Boucher, O pequeno-almoço, 1739, Museu do Louvre, Paris.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: Johann Heinrich Füssli, O desespero do artista perante a grandeza dos fragmentos antigos, 1778-1780, Kunsthaus, Zurique.
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Os salões literários desempenharam um grande papel no século XVIII. O aumento da leitura daria à França a possibilidade de criar um terreno que irá favorecer a Revolução. A estética dividiu-se entre o Neoclassicismo e o Rococó. Se Napoleão seguiu o primeiro, o segundo era o emblema de um Antigo Regime de má memória. Desenvolve-se o espírito crítico. Nasce o crítico e aquele que apenas tem uma opinião. Addison e Diderot são o emblema de um período que oscila entre a imaginação como perceção e a beleza que se constrói entre a sensibilidade e a natureza. A imprensa foi essencial para a difusão destas ideias.
Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: Jacques-Louis David, Retrato do casal Lavoisier, 1788, The Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque.

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Conteúdos na rede - A representação do belo - [O século XVIII] (3)

O neoclassicismo, ou se quisermos um novo classicismo procurou conciliar duas ideias diversas, mas que convergiram para a construção do espírito burguês. Justamente o rigor pelo que se assumia individualista e a paixão pela descoberta arqueológica. O individualismo construiu-se pela atenção dada ao domínio do privado que o domicílio vai assumir. A rigidez das normas é outra das suas vertentes. O novo classicismo procura impor uma nova Beleza, uma reformulação da beleza clássica, como uma nova Atenas, onde a razão tudo poderá entender. A paixão pela arqueologia fará despertar a curiosidade pelas terras distantes, pela procura de uma beleza diferente, exótica, que seja diferente dos ideais europeus. O antigo e original são dois dos valores por onde evoluirá o neoclassicismo. A arqueologia irá contribuir para fazer evoluir o gosto europeu. Descoberto o clássico grego como uma interpretação feita pelo século XV, o século XVIII tenta encontrar a fonte, do que poderá ser a “verdadeira” antiguidade.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem -Johann Heinrich Wilhelm Tischbein, Goethe na campina romana, 1787, Städelshes Kustinstitut, Frankfurt.
#Arazãoeabeleza; #Obelocomorepresentação

“A Beleza não é uma qualidade das coisas em si mesmas: só existe na mente que as contempla e cada mente percebe uma Beleza diferente. Também pode existir quem perceba uma Fealdade, onde outro experimenta uma sensação de Beleza; e cada um deveria satisfazer-se com o seu sentimento sem pretender regular o dos outros. Procurar a Beleza concreta ou a Fealdade concreta é uma busca tão infrutuosa quanto a de pretender estabelecer o que é realmente doce ou amargo; e é bem certo o provérbio que reconheceu a inutilidade da disputa à volta dos gostos. É absolutamente natural e até necessário estender este axioma ao gosto mental, independentemente do gosto corporal; e, assim, o senso comum que tão frequentemente se aparta da filosofia e especialmente da filosofia céptica, concorda, pelo menos num caso, com ela ao pronunciar o mesmo veredito.”

Fonte: David Hume, Ensaios morais, políticos e literários, XXIII, C. 1745..
Imagem –António Canova, As Graças, 1812-1816, Ermitage, São Petesburgo.
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A segunda metade do século XVIII conhecerá uma iconografia de heróis e ruínas, entre corpos assombrados nesse universo que nos dá a ideia de que a estética neoclássica teve exigências diversas. As ruínas entendidas como algo belo é uma afirmação nova que se funda na procura de temas originais que ultrapasse os cânones. Se encontramos o racional, também encontramos a melancolia que admira uma ruína, como é o caso de David diante do corpo apunhalado de Marat. O quadro dá-nos uma mistura de sentimentos, uma certa frieza na reprodução de uma morte, os valores estóicos de um homem da Revolução Francesa, o que nos faz misturar Razão e Revolução. No quadro de David há sem dúvida a ideia de ruína da própria vida e a consciência que a História guardará torna-se irrecuperável na vida diária.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: Jacques-Louis David, A morte de Marat, 1793, Museu de Belas Artes, Bruxelas.
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Conteúdos na rede - A representação do belo - [O século XVIII] (2)

O lado luminoso da razão:
“[O homem que tem um temperamento sanguíneo tem como predominante o sentimento do Belo]. (…) O seu sentimento moral é belo, mas sem princípios, e depende sempre diretamente das impressões imediatas que a realidade provoca nele. É amigo de todos os homens ou, o que é a mesma coisa, nunca é verdadeiramente amigo, embora seja sempre cordial e benévolo. Não sabe fingir: hoje entreter-se-á convosco com amizade e maneiras corteses, amanhã, se estiverdes doentes ou vos encontrardes em desgraça, sentirá sincera e autêntica compaixão, mas nestas circunstâncias eclipsar-se-á pouco a pouco, até que as coisas tenham melhorado.
Nunca deve ser juiz porque, normalmente, as leis são para ele demasiado severas e ele deixa-se comover até às lágrimas. É um santo a meias, nunca verdadeiramente bom e nunca verdadeiramente mau.”

Immanuel Kant, Observações sobre o sentimento do belo e do sublime, II, 1764.
Imagem: Jean-Baptiste Chardin, A mestra, 1737, Museu da Galeria Nacional da Irlanda.
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O classicismo motivado por uma exigência de maior adesão à realidade elevou o realismo das suas representações. O teatro tentou comprimir tempos e reduzir os lugares, nesta ideia de fazer coincidir o mais possível o tempo cénico e o do espetador. A Beleza construiu-se entre opostos, entre as referências do classicismo e do anticlassicismo, entre um belo exuberante e um outro mais estilizado, mais trágico. Racine foi um dos expoentes dessa construção de simultaneidade de opostos.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem – Jean-Honoré Fragonard, Coreso e Calliroe, 1760, Museu do Louvre, Paris.
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Os palácios e os jardins também contrapõem as ideias estéticas do neoclassicismo e do barroco que o antecedeu. A arquitetura barroca surpreende, pois é feita de excessos, de um assinalável conjunto de linhas curvas, de repetições de formas que são quase redundâncias. Para o século XVIII essa noção de beleza parece-lhe estranha, pouco interessante para servir de modelo. Os Ingleses e a sua arquitetura deram-nos exemplos, de como mais do que criar ideias estéticas novas, bastaria seguir os exemplos da natureza, refletir a sua Beleza. Ao contrário do barroco, o Iluminismo não pretende encantar com excessos, antes dar uma referência de harmonia, uma composição equilibrada dos cenários.

Imagem: Villa Chigi, 1680, desenhado pelo Arquitecto Carlo Fontana (Estilo Barroco), Centinale, Toscania, Itália
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Conteúdos na rede - A representação do belo - [O século XVIII] (1)

Quando Newton publicou em 1687, Dos Princípios da Filosofia Natural era um ciclo que se fechava e um outro que se iniciava. Se o livro de Newton configurava uma extraordinária aventura do pensamento humano, ele pelas informações que dava sobre os princípios mecânicos do mundo natural incentivou um conjunto de descobridores e inventores para que tudo fosse mais eficaz. Nos anos seguintes nasceria aquilo que se conhece como A Era das Revoluções. A industrial em primeiro lugar, a da razão iluminista e a das revoluções. O século XVIII é muitas vezes considerado como um século racional, cheio de coerência. O século XVIII foi também um século de extremos, de paixões e de sonhos, nem sempre pacíficos. Foi o século XVIII que inventou a noção de progresso, um conceito de evolução, como se ele fizesse parte da própria natureza das coisas. Nesta etiqueta a razão e a beleza viajaremos sumariamente pelos sonhos de beleza e razão do século XVIII.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa:Difel.
Imagem: Johann Zoffany, Charles Townley e os seus amigos na Townley Gallery, Townley Hall Art Gallery and Museum, Burney, Lancashire, 1781-1783.
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O século XVIII, muito embora seja pensado em diferentes fontes, como um período que se define por uma procura linear pela razão e ausente de contradições sabemos que não é assim. A razão do iluminismo convive com duas oposições, que são a manifestação de tantas outras ligadas à sociedade. É curioso que no século XVIII encontramos o expoente do pensamento iluminista com Kant, certamente um conjunto de ideias muito luminosas e por outro o Marquês de Sade, um espírito inquietante de um teatro de vida pouco luminoso. O Iluminismo viverá numa tentativa de conciliar a Beleza do Barroco, ainda ligada ao gosto aristocrático, a uma alegria de vida e um espírito neoclássico à procura do culto da razão.

Fonte: História da Beleza. (2005). Umberto Eco. Lisboa: Difel.
Imagem: Jean- Honoré Fragonard, O Baloiço, 1770, Coleção Wallace, Londres.
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O lado luminoso da razão:
“O homem que tem um temperamento sanguíneo tem como predominante o sentimento do Belo: as suas alegrias são estridentes e cheias de vida; quando não está alegre, está insatisfeito e conhece muito pouco a felicidade silenciosa. A variação é bela e ele gosta da mudança. Procura a alegria em si próprio e à volta de si, alegra os outros e é um bom companheiro. Sente fortemente a simpatia moral: a felicidade dos outros alegra-o, o seu sofrimento suscita a sua piedade.”

Immanuel Kant, Observações sobre o sentimento do belo e do sublime, II, 1764.
Imagem: Jean-Baptiste Chardin, O rapaz do pião, 1738, Museu do Louvre, Paris.
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