Aristócles era um jovem ateniense. Tinha
uma proveniência social favorecida pelo elevado estatuto social e económico da
sua família. Pertencia já como membro do júri num tribunal público da cidade.
Aristócles tinha dotes oratórios significativos, uma inteligência perspicaz e
uma capacidade elevada na escrita, com um estilo admirado. Aristócles era ainda
de uma formosura notável, alto e atlético. Tinha, pois, o favor dos deuses e o
seu futuro seria o que a sua família já detinha - desempenhar um papel
importante na política de Atenas.
Aristócles ouvira falar de Sócrates e dos
diálogos deste que colocavam questões relevantes. Porque seguir uma carreira
política, porque seguir as aspirações que a família para ele tinham?
Dos diálogos com Sócrates, Aristócles
pressentiu a emergência de dúvidas, a descrença em convicções construídas em
quase três décadas de vida. Aristócles procurou em Sócrates respostas para
vencer o vazio de uma vida mergulhada em ilusão. Sócrates que não se
considerava professor encaminhou-o para o mundo, para as guerras de Atenas.
Aristócles voltou três anos mais tarde e confidenciou tudo o que tinha
aprendido.
Da guerra e da violência, da cobardia e da coragem não retirara
nenhuma ideia mais certa da que lhe confirmava que a nobreza de espírito que os
filósofos procuravam, não residiam nem na inteligência, nem na riqueza.
Percebeu em palácios e em recepções que os governos das cidades não ofereciam
preocupação para os mais carenciados e que governava nas pessoas pequenos
sentimentos, pequenas certezas, a normalidade de que a realidade é aceite como
é, sem discussão. Aristócles reparou o domínio em palácios do mais ocioso e da
dificuldade em discutir a vida de um modo crítico.
Aristócles confessou a Sócrates que lhe
tinham dado um nome nas suas viagens. Platão, "o espadaúdo", o que
Sócrates achou maravilhoso, pois significava que Platão tinha cumprido um ponto
essencial da existência - conhecer a vida, vivê-la primeiro, para depois a compreender.
E acrescentou-lhe um ponto essencial da coragem socrática - questionar dentro
da alma regularmente, o modo correto de viver, procurar a verdade e compreender
que as palavras também podem ser vazias, instrumentos de eruditos, doutores da
ignorância. Platão ouvia-o falar da importância de reter na alma humana o mais
importante, o que não pode ser esquecido, o conhecimento que fazemos de nós
próprios.
Luís Campos (Biblioteca)
A partir de um texto, "Coragem", de Rob Riemen.
Imagem, Platão e Sócrates. A escola de Atenas. Rafael.
Imagem, Platão e Sócrates. A escola de Atenas. Rafael.
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