segunda-feira, 7 de março de 2016

Para ires lendo... e pensando...(VI)

O que é afinal uma maioria considerada colectivamente, senão um indivíduo com opiniões e interesses frequentemente contrários a outro indivíduo, a quem chamamos minoria? Ora, se se admite que um homem revestido de todo o poder pode abusar dele contra os seus adversários, porque não se admitirá o mesmo para uma maioria? Os homens mudarão de carácter uma vez reunidos? Passarão a ser mais pacientes perante os obstáculos ao tornarem-se mais fortes? Quanto a mim, não acredito; e o poder de tudo fazer, que recuso a um só dos meus semelhantes individualmente, não o concederei nunca a muitos deles.

A omnipotência, considerada e si mesma, parece-me uma coisa má e perigosa. O seu exercício parece-me exceder as forças de qualquer homem; apenas concebo Deus Todo-Poderoso sem que disso decorra qualquer perigo, porque a Sua sabedoria e a Sua justiça igualam sempre o Seu poder. Por conseguinte, não há na Terra autoridade que seja tão respeitável em si mesma ou que esteja investida de um direito tão sagrado que devamos deixá-la agir sem controlo e dominar sem obstáculos. Portanto, quando vejo conceder a um qualquer poder o direito e a faculdade de tudo fazer, chame-se ele povo ou rei, democracia ou aristocracia, quer se exerça numa monarquia ou numa república, digo: lá está o germe da tirania; e procuro viver sob outras leis.

Imaginai... um corpo legislativo composto de maneira a representar a maioria mas sem ser necessariamente escravo das suas paixões; um poder executivo que dispusesse de uma força própria e um poder judicial independente dos outros dois poderes; teríeis ainda um governo democrático, mas quase deixaria de haver a possibilidade de exist~encia de uma tirania.

Alexis de Tocquelive. (2001). Da Democracia na América. Cascais: principa, Vol I: Segunda parte - Cap. VII, pp. 300-302

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