domingo, 20 de março de 2016
segunda-feira, 14 de março de 2016
Para ires lendo... e pensando...(VII)
É verdade que nas democracias o povo parece fazer o que quer; mas a liberdade política não consiste em fazer o que se quer. Num Estado, isto é, numa sociedade onde há leis, a liberdade só pode consistir em poder fazer o que se deve querer, e a não ser forçado a fazer o que não se deve querer.
Tem de se ter em mente o que é a independência e o que é a liberdade. A liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem; e se um cidadão pudesse fazer o que elas proíbem, já não haveria liberdade porque os outros também teriam esse mesmo direito.
A liberdade política só se encontra nos governos moderados. Mas nem sempre ela existe nos Estados moderados; só existe quando o poder não é abusado; mas é uma experiência eterna que todo o homem que tem poder é levado a abusar dele; vai até encontrar limites. Quem diria! Até a virtude precisa de limites!
Para que se não possa abusar do poder, é preciso que, pela disposição das coisas, o poder trave o poder. Uma constituição pode ser tal que ninguém será forçado a fazer coisas que a lei não obriga, e a não fazer as que a lei permite.
Montesquieu. (2011). O Espírito das Leis. Lisboa: Edições 70. Tradução e notas: Miguel Morgado. Livro XI - Caps. II, III e IV, pp. 302-303.
terça-feira, 8 de março de 2016
Sociedade e valores....
A nossa sociedade está numa crise
de valores?
Primeiro, é
preciso ter clarificado o conceito de “crise de valores”. Trata-se de uma
quebra com a ordem hierárquica dos valores, ou com a percepção da mesma pela
população, anterior à época em estudo. Mudando a ordem hierárquica dos valores
de uma sociedade em relação à sua ordem anterior ou em relação à ordem
percepcionada anteriormente pelas pessoas, de forma negativa, estamos perante
uma crise de valores.
Contudo, a
subida ao poder dos valores úteis não ocorreu de facto. Já se encontrava
instalada nas mentes das classes dirigentes (políticos, burgueses, nobres,
alguns membros do clero), os verdadeiros detentores do poder, desde o início do
Renascimento, senão da Alta Idade Média. O que mudou foi a sua instalação nas
mentes das classes mais baixas, para estimular o consumo. Isto foi conseguido através
da publicidade e da facilitação do consumo.
Assim, a adquirida importância dos valores úteis não foi o resultado de uma
mudança radical na hierarquização dos valores da sociedade, já que as classes
dirigentes já pensavam dessa maneira. Esta situação pode ser considerada
negativa, visto que transforma o ser humano numa máquina de consumo desenfreado
e irracional: a felicidade depende do valor líquido dos bens, e não da
realização enquanto ser humano.
Outra
situação com possível conotação negativa é a subida na hierarquia dos valores
estéticos. Enquanto a sua redefinição é um produto do normal curso da evolução
da criação artística, na arte, o aumento da sua importância leva-nos a
considerar a aparência antes de tentar chegar à essência. Apenas o texto e
apenas o som não parecem satisfazer ninguém. É precisa a imagem, e apenas o que
estiver incluído numa margem específica de atributos é considerado belo e
tolerável. Impingem-nos um ideal de beleza que devemos tentar alcançar a todo o
custo, mesmo que o caminho passe pela compra de inúmeros produtos supérfluos.
Testemunhamos
ainda a valorização da ciência e dos valores lógicos. Seguir um caminho
empírico em que são necessárias provas e lógica para justificar a escolha dos
nossos cursos de acção tem os seus atributos positivos, mas será que o Homem
foi feito para considerar apenas o verdadeiro e o falso e para agir segundo
padrões de probabilidade de consequências? Não. Se fosse, seria um computador.
Os cálculos e estatísticas fazem-nos esquecer que cada pessoa é singular na sua
existência.
Os valores religiosos
também chegaram a um papel menor nas sociedades. Por um lado, o indivíduo não
sujeito à religião organizada é mais capaz de pensar por si mesmo mas, pelo
outro, deixa de ser educado acerca de alguns valores que estão na base de, por
exemplo, outros valores ético-morais importantes.
O que eu
penso que marcou, contudo, acima de tudo o resto, o século que passou, foi a
queda dos valores familiares tradicionais e, primeiro, a valorização e, depois,
a desvalorização dos valores ético-morais. Grande parte do mundo ocidental
largou o seu conceito de família antigo e passou a incluir nele os agregados
familiares menos comuns, como os homossexuais e os monoparentais. Ocorreu a
emancipação da mulher e a revolução sexual. Pela mesma altura, surgiram desejos
de igualdade social generalizados para as populações oprimidas, sustentadas por
valores ético-morais de justiça, que juntaram autênticas multidões em razão de
uma causa comum. Infelizmente, isto deu lugar ao individualismo, com provável
base na valorização dos valores úteis. Esta nova forma de pensar provocou e
expandiu problemas sérios, tais como a pobreza, a injustiça social e a
degradação do ambiente.
Estas
mudanças não são inéditas à Humanidade. No seu dinamismo e adaptabilidade, a
sociedade está em constante mutação. Para as antigas gerações e até para alguns
membros das mais novas, estaremos num constante estado de “crise de valores”
devido ao carácter subjectivo dos mesmos. O que é importante é conservar os
valores que trazem o bem-comum – apesar de este também ter um carácter
subjectivo – e educar os novos para que possam definir os seus próprios valores
de maneira consciente
e responsável.
José Soares
Trindade Nunes dos Santos, nº 12, 10º C1
segunda-feira, 7 de março de 2016
Para ires lendo... e pensando...(VI)
O que é afinal uma maioria considerada colectivamente, senão um indivíduo com opiniões e interesses frequentemente contrários a outro indivíduo, a quem chamamos minoria? Ora, se se admite que um homem revestido de todo o poder pode abusar dele contra os seus adversários, porque não se admitirá o mesmo para uma maioria? Os homens mudarão de carácter uma vez reunidos? Passarão a ser mais pacientes perante os obstáculos ao tornarem-se mais fortes? Quanto a mim, não acredito; e o poder de tudo fazer, que recuso a um só dos meus semelhantes individualmente, não o concederei nunca a muitos deles.
A omnipotência, considerada e si mesma, parece-me uma coisa má e perigosa. O seu exercício parece-me exceder as forças de qualquer homem; apenas concebo Deus Todo-Poderoso sem que disso decorra qualquer perigo, porque a Sua sabedoria e a Sua justiça igualam sempre o Seu poder. Por conseguinte, não há na Terra autoridade que seja tão respeitável em si mesma ou que esteja investida de um direito tão sagrado que devamos deixá-la agir sem controlo e dominar sem obstáculos. Portanto, quando vejo conceder a um qualquer poder o direito e a faculdade de tudo fazer, chame-se ele povo ou rei, democracia ou aristocracia, quer se exerça numa monarquia ou numa república, digo: lá está o germe da tirania; e procuro viver sob outras leis.
Imaginai... um corpo legislativo composto de maneira a representar a maioria mas sem ser necessariamente escravo das suas paixões; um poder executivo que dispusesse de uma força própria e um poder judicial independente dos outros dois poderes; teríeis ainda um governo democrático, mas quase deixaria de haver a possibilidade de exist~encia de uma tirania.
Alexis de Tocquelive. (2001). Da Democracia na América. Cascais: principa, Vol I: Segunda parte - Cap. VII, pp. 300-302
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