"Como a razão nada exige que seja contrário à natureza, exige, por consequência, que cada qual se ame a si mesmo, busque a sua própria utilidade - o que realmente lhe seja útil -, apeteça tudo aquilo que conduz realmente o homem a uma perfeição maior e, em termos absolutos, que cada qual se esforce quanto estiver na sua mão por conservar o seu ser. (...)
E assim, nada mais do que o homem é útil ao homem; quero dizer que nada podem os homens desejar que seja melhor para a conservação do seu ser do que concordarem todos em todas as coisas, de maneira a que as almas de todos formem como que uma só alma, e os seus corpos como que um só corpo, esforçando-se todos à uma, tanto quanto possam, por conservar o seu ser, e buscando todos ao mesmo tempo a utilidade comum.
Daqui se seguindo que os homens que se guiam pela razão, quer dizer, os homens que buscam a sua utilidade sob a condução da razão, não apetecem para si nada que não desejem para os demais homens, e por isso, são justos, dignos de confiança e honestos". (Espinosa, Ética).
Podemos estudar muitos assuntos e não podendo estudar todos poderemos alguns não os aprender. Podemos viver sem saber nada sobre astrofísica ou o funcionamento biológico da natureza. Não podemos viver sem aqueles assuntos que estão muito dependentes da vida que construímos. Não podemos viver sem conhecer os riscos que ameaçam a nossa relação com os outros. Nas nossas escolhas há modos de viver que não nos são úteis. Precisamos de saber o que pode ser bom nas nossas vidas e o que nos pode prejudicar. Sendo que a vida que cada um tem é uma escolha do que pretende ser, temos de saber construir a dimensão de um conceito essencial - a liberdade. A nossa liberdade é condicionada pelos elementos culturais, pelas formas e usos da linguagem, pelo conjunto de hábitos sociais. Temos na liberdade a opção de escolher um caminho. Mas como o faremos? Com que graus de escolha?
Acontecem-nos coisas que não controlamos. O local onde nascemos, os dados culturais e sociais onde aprendemos a linguagem com que medimos o mundo. Mas temos alternativas. Podemos dar as respostas que melhor nos convém. Temos a possibilidade de ensaiar caminhos, de ver mais alto, de procurar respostas. Se estamos dependentes da nossa vontade, ela para cumprir a nossa essência de liberdade necessita de duas condições. Justamente o conhecimento do mundo e de nós próprios.
Entre o que nos limita e o mundo há as nossas convições, a nossa expressão de liberdade. Na escolha que fazemos sobre o que é mais agradável para a nossa vida fazemos escolhas, procuramos o que se designa a arte de viver. Esta arte de viver é de um modo mais prático o que podemos chamar Ética.
(A partir de algumas ideias de Fernando Savater, Ética para um Jovem).
Luís Campos (Biblioteca)
(A partir de algumas ideias de Fernando Savater, Ética para um Jovem).
Luís Campos (Biblioteca)
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