terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Para ires lendo... e pensando...(I)

"E se agora, deixando no chão o escudo lavrado e o forte capacete e apoiando a lança contra o muro, saísse ao encontro do inexorável Aquiles, lhe dissesse que permitia aos Atridas que levassem Helena e as riquezas que Alexandre trouxe para Ílion nos côncavos navios, pois foi isso que originou a guerra, e se oferecesse para repartir com os Aqueus metade do que a cidade contém e mais tarde fizesse os troianos jurarem que, sem nada ocultar, formariam dois lotes com quantos bens existem dentro desta formosa cidade?... Mas porque me faz o coração pensar em coisas tais?" 

(Homero, Ilíada).

A Ilíada é um poema épico composto por vinte e quatro cantos escritos em versos. O seu nome deriva do nome grego Ílion, que significa Tróia. É justamente um livro atribuído a Homero e que relata o último ano da guerra de Tróia. O poema foi escrito num dos dialectos da Jónia e existem estudiosos que acreditam ser uma memória da tradição oral contada pelos "aedos" (contadores de histórias) e que apenas no século VI a.C. terá sido impresso. A sua divisão e vinte e quatro cantos que chegou até nós pensa-se ter sido feita na Biblioteca de Alexandria.

A guerra de Tróia fazia parte da memória dos gregos, como um episódio ocorrido no período micénico (1200 a.C.) e onde encontramos descrições de técnicas e armas desse período, pelo que se pode considerar a sua origem perto do século VIII a.C. A Ilíada influenciou muito os autores clássicos e é considerada uma das mais importantes obras da literatura mundial. O fundo da narrativa (em poucas palavras) relata o último ano da guerra de Tróia e opõe Aquiles e Heitor, os Aqueus (a antiga designação dos gregos) e os Troianos. 

A Ilíada dá-nos muito sobre as condições em que a natureza convive com as suas opções, as escolhas que temos de fazer. Na Ilíada encontramos como ideia-base, a que conduz Aquiles, na luta pelo respeito devido a cada um, ao que é, ao papel que tem na sociedade. A luta de Aquiles, a sua raiva vive dessa coragem pelo que se é, pelo que se acredita, pela sua essência. A Ilíada dá-nos ainda uma outra dimensão, que é a de fazer respeitar uma ideia do que somos, mas pensando nos outros, juntando essas duas dimensões, que é o que Heitor faz. Entre o que somos, o que nos identifica podemos defendê-lo acima de qualquer critério, ou em função dos outros, do que também amam? 

Devemos como Aquiles perseguir um desejo, uma ambição a qualquer preço, ou a ideia de Heitor que luta por uma cidade, por um património humano? Existe altruísmo nestas duas escolhas, ou apenas um desejo esquecido de amor pelos outros? Entre força e ânimo físico e heroísmo, o que escolher? Aquiles descobrirá que a morte de Heitor não lhe trará Prátoclo. É essa a essência da Ilíada e que nos conduz a pensar as escolhas que podemos fazer. Afinal a vida não é uma promessa e o sofrimento, a ausência, a perda é uma das suas componentes. As escolhas implicam também isso, esse conhecimento, essa possibilidade. É este o primeiro pensamento que aqui deixámos e que nos conduz aos horizontes da Ética.

Luís Campos (Biblioteca)

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